Flor de Lótus

Tomei um banho gelado, mas não senti. Meu corpo fervia dentro de mim. Ele queria sair, e de alguma forma saiu. O fogo me queimava dentro e eu não sabia como não o ter. Tirei todos os meus pelos, para parecer menos selvagem. Tirei toda a minha falsa modéstia, para parecer segura. Mas de fato, o que há dentro nunca se sabe e vai de fato poder controlar.
Talvez este seja o verdadeiro problema... O controle. A ilusão da perda. Da matéria, da vida. E de fato, nem é um problema é apenas uma passagem... Distinta e frágil. Onde se parece forte mas por dentro está em cacos quebrados, unidos com uma cola fina de esperança. Porque é tudo parte do drama e parte da jornada misteriosa da vida.
Fiquei em silêncio absoluto e só ouvi a mim mesma. E todo o poder que eu havia descoberto era muito maior do que eu imaginava. Uma força tão avalassadora que eu compreendi o meu lugar. Compreendi o anseio e o medo deles, e também o porque havia sido subestimada. Que caos interessante de ver.
São camadas profundas diante de tantas e tantas passadas pela vida... Pelo respirar. Pelo andar, tocar... tudo me parece novo e ao mesmo tempo reconheço no cheiro de memória.
Que fogo gostaria de apagar em mim em algo que não poderia nem sequer ver fogo. Que sede gostaria de matar onde existia apenas o deserto. Tudo dentro de mim como um complexo contraditório sentir. Eu ouvi que atrairia também as sombras da condição humana. Que curioso é ver essa condição dúbia. Totalmente frágil e resistente. E quais seriam as bases? Elas seriam assim tão importantes?
O que a minha alma quer? O que ela deseja? O que seria ela sem os componentes humanos limitantes do corpo e da matéria?
Ela seria fogo e água.
Terra e ar.
Seria uma completude exata de elementos e um mistério do tempo que eu não posso explicar. Uma conjuntura de acertos e falhas, completamente ligadas a um nó invisível. Eu deveria correr? Mas por que? Não consigo fugir de mim.
Não consigo fugir da consciência dessa alma que olha com olhos que nunca piscam. Que sabe cada nuance e pedaço escondido do incosciente. Que compreende cada ação, atitude, pensamento e devaneio. Que cutuca as laças cheias de lamas para recriar uma flor de lótus. Regenerada, nascida da lama e do grotesco.
Que doce e amargo é a vida... 
Que lodosa e sútil é a flor.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mergulhe

Cartas de amor para um desconhecido

Demais