No dedilhado dele

No dedilhado dele, eu me desfazia, desnudada de mim.
Como podia me arrastar para dentro de seus sons sem sequer me tocar? Um feitiço invisível, um chamado irresistível.
A boca desenhava promessas no ar, a língua falava segredos que eu só poderia decifrar em silêncio.
O grave do seu baixo reverberava em minha pele, um comando sem palavras, uma potência que me dobrava sem resistência.
E eu, perdida e entregue, voltava a viver ali, no pulsar da sua música.

Eu dizia—e ainda digo—que o baixo toca o coração.
Mas por que o universo escolheu justo você para tocar o meu?
Fantasioso, platônico, como deve ser uma paixão que se alimenta do inalcançável.
Sua dança no instrumento era um convite à vertigem.
Eu queria ser aquela curva, aquela corda.
Lamber sua alma com os olhos, pois seu olhar hipnotizou o caos dentro de mim.

E então, sua água me trouxe de volta à terra.
Ainda respiro, ainda ardo.
Com seus dreads como raízes no vento, com seu ritmo embalado em doçura e tempestade.
Eu, um espectro à distância, incapaz de quebrar a timidez, apenas observava.
O que dizer daquele que acalmou meu mar revolto sem nem me notar?

Resta-me agradecer à maçã e à vela vermelha.
Por sussurrarem que os sentimentos ainda vivem.
Dentro, fora. Reais, ilusórios.
Mas vivos. Sempre vivos.

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